2009-03-28

A CARTA ANÓNIMA

Quando toda a gente estava a esquecer-se do "caso Freeport" e alguém começava a respirar de alívio (repare-se que o eco das 6as. feiras da TVI é nulo), eis que alguém, desastradamente, começa a mexer no que cheira mal. Compreende-se. Eu também fico chateado quando falam mal do secretário do clube da minha rua, e até já fiz minha a máxima de um respeitável político da nossa praça (ex-político, para ser mais correcto): quem se mete com o meu clube, leva.
O bastonário da Ordem dos Advogados, é uma espécie de "Palmelão" do direito. Barafusta, acusa, dispara em todas as direcções para, no fim, nada sair de jeito. Mas faz estardalhaço, que é o que convém. Repare-se que, quando o "processo Casa Pia" estava na sua "máxima força", lá veio o homem a terreiro acusar forças invisíveis de quererem decapitar o PS. Agora, com o caso "Freeport" a estória é outra: uma repugnante carta anónima, em conluio com a Polícia Judiciária.
Patético, no mínimo.
Porque o sr. bastonário não sabe (mas devia saber) como é que as coisas funcionam. E vai daí, há que lançar poeira para os olhos dos portugas, com a mirabolante mas desastrada história da carta anónima. Mas eu explico como as coisas funcionam. Não ao sr. bastonário, que sabe muito bem como é que as coisas funcionam, mas para tirar eventual poeira dos olhos.
Um cidadão encontra-se de posse de elementos comprometedores contra alguém. Vai à polícia - qualquer polícia - e diz que tem tais elementos, mostra-os ao polícia de serviço. O polícia de serviço vê os elementos apresentados pelo cidadão e verifica que têm credibilidade. Mais: são graves. Apresenta o caso superiormente e o superior concorda: o caso tem "pernas para andar" e decide aceitar a denúncia. "ALTO E PÁRA O BAILE!!!", berra o cidadão. "Eu ontem estava a tomar banho, e verifiquei que tenho cu. E, como toda a gente sabe, quem tem cu tem medo. Eu quero denunciar, mas o meu nome NÃO PODE aparecer em lado nenhum. Por muito menos, houve quem tivesse levado sumiço." Que solução resta? "Olhe, caro cidadão: escreva uma carta anónima a denunciar isso". Tão simples como isto. Situações que acontecem todos os dias. Quem é o polícia que nunca recebeu uma denuncia anónima, ou uma informação anónima? Será que o sr. bastonário ignora essas coisas? Que andou ele a fazer este tempo todo, na advocacia?
A verdade, porém, é que ainda ninguém disse que, quer o conteúdo da carta, quer o conteúdo de um famoso DVD, quer as informações oriundas da polícia inglesa são falsos. Não. O que se diz - o sr. bastonário diz - é que a carta anónima foi feita com o conluio da Polícia Judiciária. Faltou-lhe dizer que foi a PJ que escreveu a carta...
Bom. O sr bastonário quer protagonismo? Conseguiu. Quer aparecer nos meios de comunicação social? Deferido. Quer defender alguém? Bom. Aí, fia mais fino. Com "defesas" dessas, qualquer suspeito dispensa o Ministério Público.
Será que ele ignora que estamos em Portugal? E que de Fátima até Felgueiras, qualquer político que seja acusado de corrupção ou actos menos lícitos está condenado a ser reeleito, e com maioria absoluta? Será que não sabe o que se passa com loureiros, torres, morais, etc?
Mau serviço, sr. bastonário. Mau serviço.
Fique quieto e calado. Deixe que o acusem. Quanto mais acusações, melhor. Maiores são as garantias de se apresentar como um novo "Cristo" perante o eleitorado. E o sr. sabe como o bom povo português gosta de "cristos", sejam eles majores, doutores ou engenheiros. Não defenda mais, entretenha-se a ler o Código Penal.
Olhe que, se continua assim, o homem arrisca-se a perder as eleições. E a culpa é toda sua.

2009-03-23

"INCOERÊNCIA CATÓLICA"

Mão amiga fez-me chegar este texto, da autoria do Dr. Drauzio Varela. Drauzio Varela é médico. Escreveu , entre vários livros, "Estação Carandiru", um livro que conta sua experiência com presidiários, e depois virou filme.
"Por um fio", a história de um paciente terminal.


Artigo publicado no jornal Folha de São Paulo, em 14 de março de 2009

DRAUZIO VARELLA

Incoerência católica

AOS COLEGAS de Pernambuco responsáveis pelo abortamento na menina de nove anos, quero dar os parabéns. Nossa profissão foi criada para aliviar o sofrimento humano; exatamente o que vocês fizeram dentro da lei ao interromper a prenhez gemelar numa criança franzina.
Apesar da ausência de qualquer gesto de solidariedade por parte de nossas associações, conselhos regionais ou federais, estou certo de que lhes presto esta homenagem em nome de milhares de colegas nossos.


Não se deixem abater, é preciso entender as normas da Igreja Católica. Seu compromisso é com a vida depois da morte. Para ela, o sofrimento é purificador: "Chorai e gemei neste vale de lágrimas, porque vosso será o reino dos céus", não é o que pregam?


É uma cosmovisão antagônica à da medicina. Nenhum de nós daria tal conselho em lugar de analgésicos para alguém com cólica renal. Nosso compromisso profissional é com a vida terrena, o deles, com a eterna. Enquanto nossos pacientes cobram resultados concretos, os fiéis que os seguem precisam antes morrer para ter o direito de fazê-lo.


Podemos acusar a Igreja Católica de inúmeros equívocos e de crimes contra a humanidade, jamais de incoerência. Incoerentes são os católicos que esperam dela atitudes incompatíveis com os princípios que a regem desde os tempos da Inquisição.


Se os católicos consideram o embrião sagrado, já que a alma se instalaria no instante em que o espermatozoide se esgueira entre os poros da membrana que reveste o óvulo, como podem estranhar que um prelado reaja com agressividade contra a interrupção de uma gravidez, ainda que a vida da mãe estuprada corra perigo extremo?

O arcebispo de Olinda e Recife não cometeu nenhum disparate, agiu em obediência estrita ao Código Penal do Direito Canônico: o cânon 1398 prescreve a excomunhão automática em caso de abortamento.

Por que cobrar a excomunhão do padrasto estuprador, quando os católicos sempre silenciaram diante dos abusos sexuais contra meninos, perpetrados nos cantos das sacristias e dos colégios religiosos? Além da transferência para outras paróquias, qual a sanção aplicada contra os atos criminosos desses padres que nós, ex-alunos de colégios católicos, testemunhamos?

Não há o que reclamar. A política do Vaticano é claríssima: não excomunga estupradores.

Em nota à imprensa a respeito do episódio, afirmou Gianfranco Grieco, chefe do Conselho do Vaticano para a Família: "A igreja não pode nunca trair sua posição, que é a de defender a vida, da concepção até seu término natural, mesmo diante de um drama humano tão forte, como o da violência contra uma menina".

Por que não dizer a esse senhor que tal justificativa ofende a inteligência humana: defender a vida da concepção até a morte? Não seja descarado, senhor Grieco, as cadeias estão lotadas de bandidos cruéis e de assassinos da pior espécie que contam com a complacência piedosa da instituição à qual o senhor pertence.

Os católicos precisam ver a igreja como ela é, aferrada a sua lógica interna, seus princípios medievais, dogmas e cânones. Embora existam sacerdotes dignos de respeito e admiração, defensores dos anseios das pessoas humildes com as quais convivem, a burocracia hierárquica jamais lhes concederá voz ativa.

A esperança de que a instituição um dia adote posturas condizentes com os apelos sociais é vã; a modernização não virá. É ingenuidade esperar por ela.
Os males que a igreja causa à sociedade em nome de Deus vão muito além da excomunhão de médicos, medida arbitrária de impacto desprezível. O verdadeiro perigo está em sua vocação secular para apoderar-se da maquinária do Estado, por meio do poder intimidatório exercido sobre nossos dirigentes.

Não por acaso, no presente episódio manifestaram suas opiniões cautelosas apenas o presidente da República e o ministro da Saúde.

Os políticos não ousam afrontar a igreja. O poder dos religiosos não é consequência do conforto espiritual oferecido a seus rebanhos nem de filosofias transcendentais sobre os desígnios do céu e da terra, ele deriva da coação exercida sobre os políticos.

Quando a igreja condena a camisinha, o aborto, a pílula, as pesquisas com células-tronco ou o divórcio, não se limita a aconselhar os católicos a segui-la, instituição autoritária que é, mobiliza sua força política desproporcional para impor proibições a todos nós.

Folha de São Paulo, 14/3/09, Folha Ilustrada

2009-03-21

ENTREVISTA COM MICHEL ONFRAY

Entrevista o filósofo e escritor Michel Onfray "A Igreja Católica sempre legitimou a violência dos Estados"

"A ideologia da Igreja é reacionária, conservadora e insuportável.Durante e após a II Guerra Mundial, ela excomungou todos os comunistas e nunca excomungou um único nazista"


Michel Onfray

A polêmica sobre a decisão do arcebispo de Olinda e Recife, Dom José Cardoso Sobrinho, que excomungou os médicos que realizaram o aborto no episódio da menina estuprada pelo pai ganhou repercussão internacional. Para o filósofo francês Michel o­nfray, decisão é coerente com pensamento oficial da Igreja Católica de hoje. "A ideologia da Igreja é reacionária, conservadora e insuportável. A Igreja apresenta indignações seletivas. Durante e após a II Guerra Mundial, ela excomungou todos os comunistas e nunca excomungou um único nazista", critica o­nfray.

O filósofo francês Michel o­nfray, iniciador da Universidade Popular de Caen , autor de 51 livros, traduzidos em mais de 20 línguas, e de uma coleção de 12 CDs, aposta na Filosofia como meio de vencer o lado irracional do ser humano: "Apesar do sofrimento da existência humana, que sempre existiu e existirá, é preciso viver em pé, com dignidade e não ajoelhado. O filósofo tem a obrigação de construir um movimento universal de elevação da condição humana".

Por ocasião da sua passagem por Bordeaux, para o lançamento de seu último livro, "Contra-história da Filosofia: as radicalidades existenciais" , Michel o­nfray nos concedeu uma entrevista para Marta Fantini sobre o lastimável episódio do aborto terapêutico, ocorrido em Recife.

Marta Fantini: O sofrimento de uma família, que deveria permanecer na esfera privada, acabou se tornando um evento midiático de repercursão internacional, devido a uma punição da Igreja Católica que parece sair das "entranhas da Idade Média": a excomunhão.

Michel o­nfray: A decisão parece da Idade Média, mas ela está inscrita no corpus do pensamento oficial da Igreja de hoje. Não se pode ignorá-la: a Igreja diz claramente que o aborto é proibido, que é um pecado e o clero aplica o que a Igreja professa. Na minha opinião, não há incoerência entre a excomunhão, que é insignificante, e a ideologia da Igreja, que é reacionária, conservadora e insuportável.

A Igreja apresenta indignações seletivas. Durante e após a II Guerra Mundial, ela excomungou todos os comunistas e nunca excomungou um único nazista. Hitler nunca foi excomungado assim como os ideólogos do nazismo e os membros do partido. A Igreja somente demonstra o que ela foi e é, colocando-se sempre ao lado dos fortes, dos poderosos, da colaboração. Ela não resiste. Ela não se preocupa com os pobres. Ela não demonstrou misericórdia a este ser frágil que foi violentado pelo padrasto. Ela não apoiou esta menina. Ao contrário, ela ainda a afligiu, considerando-a até culpada e responsável.

Eu li na imprensa francesa que, para o bispo de Recife, o estrupo é menos grave que o aborto. Quando alguém lhe perguntou porque o padastro não foi excomungado, ele respondeu que "dar a morte é mais grave". Dar a morte a um feto é mais grave que o estupro e a pedofilia? O feto é um ser potencialmente vivo que está programado para se tornar uma pessoa, mas não é uma pessoa. Antes que se torne um ser humano, pode-se praticar o aborto, e sobretudo, nestas condições, parece-me um ato evidente.

MF : Como explicar esta insistência em preservar a vida se, por outro lado, a Igreja sempre legitimou a violência dos Estados?

MO: Ela pretende defender a vida, mas ela não a defende. o­nde está a dignidade nesta aventura? O que se pode chamar de vida? o­nde ela se encontra? Numa manifestação biológica? Neste caso a simples ejaculação, na hora da masturbação, é um genocídio! É preciso parar com isso. O espermatozóide é matéria viva. Neste caso, ela deveria excomungar todos os homens que se masturbam, pois os espermatozóides vão terminar no fundo de um vaso sanitário e não na destinação prevista que é a fecundação do óvulo! É um delírio total esta posição da Igreja que se diz defensora da vida e, ao mesmo tempo, justifica a pena de morte no "Catecismo da Igreja Católica".

Eu até ganhei uma caixa de champanhe numa aposta com alguém que não acreditava que isso fosse possível! No "Catecismo da Igreja Católica" está escrito, explicitamente, que, em alguns casos extremos, pode-se aplicar a pena de morte. Sinto muito, é uma questão de princípio: não se defende a pena de morte quando se é cristão. E ainda querem que acreditemos que defendem a vida quando se defende, ao mesmo tempo, a pena de morte?

A Igreja defendeu a vida ao dar a bênção às bombas atômicas que explodiram em Hirocsima e Nagasaki? Ela defendeu a vida ao dar a bênção às armas que serviram para assassinar os republicanos espanhóis durante a Guerra da Espanha?. A Igreja pretende defender a vida, mas o que ela defende é o poder em vigor. Na verdade, o que fascina a Igreja é a morte. É a morte que lhe interessa.

MF: O que a imprensa francesa não citou, nos inúmeros artigos sobre este trágico evento, é que a Igreja, no Brasil, enfrenta uma queda de braço com o Estado. A República democrática brasileira se moderniza: a pesquisa sobre as células troncos foi liberada, a legalização do aborto está em discussão, a população se beneficia da distribuição gratuita de preservativos e pílulas do dia seguinte. Como explicar que esta Igreja, que não consegue acompanhar a evolução dos costumes morais e o progresso da Ciência, está se tornando cada vez mais fundamentalista?

MO : A questão não é o que ela está se tornando, o problema é que ela sempre foi e é fundamentalista. Acredito que, ultimamente, a Igreja está tentando colocar as coisas no seu eixo original. Com o recente retorno do islamismo, no mercado intelectual, ideológico e espiritual, ela diz que nem tudo está perdido para as religiões. Ela constata que, finalmente, ainda existem pessoas que acreditam em Deus e que em nome de Alá são capazes de morrer por ele, de lutar por ele, de viver por ele, que se comportam, na existência de uma vida cotidiana, de acordo com os preceitos que teriam sido ditados por ele. Penso que a Igreja está numa lógica de reconquista e que é o momento ideal de avançar seus peões. O papa Bento XVI, começou a avançá-los, por exemplo, com a reabilitação dos bispos negacionistas. Quando percebeu que esta estratégia estava provocando muito debate na imprensa internacional, ele recuou.

Acredito que há uma espécie de desejo de reconquistar a fé em escala planetária. Eu li no Le Figaro, o único jornal disponível no hotel, uma página inteira consagrada ao Papa e à carta que ele enviou aos bispos. Ele cita que o desejo de São Pedro era fazer proselitismo. O cristianismo e o número 1 dos cristãos, Bento XVI, concluem: se o Islã faz proselitismo e obtem resultados positivos, porque a Igreja Católica também não o faria? É uma maneira de reconquistar o terreno perdido, em todos os países.

É o que aconteceu na Itália. Recentemente, houve uma eleição ultra politizada, uma espécie de referendum sobre a questão do aborto, do reembolso deste tipo de intervenção, de células troncos, etc. A Igreja pediu a abstenção. Uma boa tática que se revelaria na hora da contagem dos votos, uma prova que a abstenção seria a Igreja, com um número considerável de vozes. A era de João Paulo II, da mediatização do tipo «rock star» e das viagens planetárias, terminou. O ecumenismo, da época em que se dançava com os aborígines, na Austrália, como pretexto de comunhão com o sagrado, tudo isso acabou. O único objetivo da Igreja atual é o retorno à antiga boa fé católica apostólica romana. Neste período de niilismo generalizado, ela se impõe uma posição mais rígida. A suspensão da excomunhão dos bispos negacionistas, o que se passou na Itália e no Brasil, são, para mim, sinais convergentes.

MF : Com a crise, o fundamentalismo pode piorar no seio das três grandes religiões monoteístas? A micro resistência, à qual você sempre faz alusão, não seria uma esperança como foi a Teoria da Libertação ou os Movimentos Pastorais na América Latina?

MO: As microresistências são a única solução possível. Eu penso que há cristãos que não estão de acordo com esta opção de direita à extrema direita da Igreja. Na “Golias”, uma excelente revista, publicada por católicos franceses de esquerda, pode-se encontrar artigos extremamente inteligentes. No último número, por exemplo, publicaram análises interessantes sobre o caso do bispos negacionistas. Há sempre uma categoria de católicos de esquerda com a qual se pode contar. Há sempre alguém que não aceita o inaceitável, que não se submete. Há esta esperança e há também a esperança no avanço do combate ateu.

Nos Estados Unidos e na Inglaterra as obras sobre o ateísmo fazem muito sucesso. «O Tratado da Ateologia» foi best seller na Austrália, Espanha e Itália, quer dizer, se fizermos avançar o combate ateu, obteremos soluções. Evidentemente, sem repetir o erro do «ser ateu» do século XIX: anticlerical , mas fabricante de uma espécie de igreja atéia, de clero ateu. Seria o pior que poderia acontecer, ou seja, querer destruir, utilizando os mesmos métodos. É preciso avançar argumentos, debater questões como as dos tratamentos paliativos, da eutanásia… A França está com muito atraso em relação a estes assuntos. Porque a eutanásia não avança, mas sim os tratamentos paliativos? Porque o lobby cristão é potente para interferir nas decisões dos deputados e dos senadores e impedir que a lei sobre a eutanásia seja votada.

MF: Seus livros estão traduzidos em mais de vinte línguas e a venda de seus CDs atingiram 50 mil exemplares. Parece-me um número impressionante, em se tratando de conteúdo filosófico. Este sucesso seria a prova que a Filosofia preenche um vazio deixado pela religião que já não satisfaz a busca espiritual do ser humano do século XXI ?

MO: Minha proposta é sair da era religiosa e teológica para entrar na era filosófica. É preciso parar de projetar a vida em universos inexistentes para construir a sua existência. Devemos nos contentar com este mundo real, examinar o que podemos fazer de nossas existências nesta vida que é pós moderna, pós industrial, pós fascista, pós comunista e pós cristã, seguramente. O que podemos fazer num período de niilismo? Somente a Filosofia poderá trazer as respostas. Gostaria que os livros de catecismo fossem substituídos, nas escolas, por ateliers de Filosofia, gostaria que todos nós refletíssemos juntos para, pelo menos, provocar a vontade de adquirir conhecimento. Sobretudo para aqueles que ficaram às margens, pois um dia, alguém disse que a Filosofia não era para eles; que ela foi feita para a elite, para a aristocracia e quem não fizesse parte dela, não teria direito a ela.

O desejo da filosofia é o desejo da sabedoria, da necessidade de ética, de reflexão e de moral. Almejo uma Filosofia que esclareça, que simplifique sem se empobrecer. Quando me deparo, nos meus cursos da Universidade Popular de Caen, com anfiteatros lotados, com mais de mil pessoas, com transmissão em vídeo no saguão, para aqueles que não conseguiram entrar, eu constato que é possível, que a Filosofia poderá vencer o irracional.

Marta Fantini é produtora e apresentadora do programa “Le Brésil en Noir & Blanc”, na Rádio Campus Bordeaux, França.

O PAPA É CONTRA A FEITIÇARIA

Acho que pela primeira vez aplaudo o "pastor alemão". Ele quer acabar com a feitiçaria, e eu assino por baixo. Parece que é desta vez que se vai deixar de distribuir o Cristo às rodelas. Porque, na verdade, transformar páo ázimo em carne de um gajo qualquer, não é feitiçaria?

2009-03-20

A INFANTARIA

Cumprindo as ordens do médico, que me mandou fazer grandes caminhadas, decidi-me a dar um longo passeio pela Internet. Eis senão quando um poema aparece à minha frente. E uma nostalgia incontrolável, invadiu-me: tinha lido este mesmo poema em Mueda, "Terra da Guerra", Moçambique.

Voltei a lê-lo; e a empolgar-me com a linguagem que o poeta utilizou, e que foi tão bem traduzida e adaptada para o português.

O poema estava na página do Bruno, no HI5. Não sei quem é este Bruno, mas tenho de arranjar maneira de o felicitar. Há que tempos, eu andava à procura deste poema!

Eu também fui infante…


Tinha acabado a guerra; e Deus, lá nas alturas,

Cercado de astros de oiro e pulcros querubins,

Ouviu sons marciais, fanfarras e clarins,

E um ardente vozear de humanas criaturas.

"Que rumor – perguntou perturba assim o ar?"

"Senhor lhe responde alguém da corte celestial

-Os bravos vencedores da Guerra Mundial,

Sob o Arco do Triunfo estão a desfilar."

Na célica mansão um sussurro se expande;

E a densa legião de almas plenas de graça

Acorre curiosa e se debruça e esvoaça,

P'ra melhor distinguir a marcha heróica, grande!

Então o bom S. Pedro, o santo venerando,

Que por mando divino é dos céus o porteiro,

Gritou: "Chamai Flambeau, o esperto granadeiro,

Para explicar o que se for passando."

Flambeau, que combateu e foi dos mais ousados,

Acercase atencioso, observa por momentos E informa:

"Vão ali famosos regimentos,

A glória militar, indómitos soldados!"

Cavaleiros, então, avançam com ardor,

E ele anunciou: "Desfilam os dragões!..."

Estremecem no céu os áureos portões,

Que a voz do povo era um estrídulo clamor.

- "Mas isto nada é...", disse Flambeau atento.

"Olhai a Artilharia!..." Em enorme alarido,

Reboam saudações qual ciclone enfurecido,

Ascendendo em rajada até ao firmamento.

E Flambeau continua: "Isto ainda não é nada!

Vereis melhor Senhor... Eis os aviadores!..."

Regougam pelo espaço os potentes motores,

A ponto tal que a voz do povo é sufocada.

Flambeau proclama com enlevo! "Os Marinheiros..."

Desta vez o entusiasmo os mundos excedeu;

E cativado, o sol, palmas de oiro abateu

Sobre os rijos heróis, que foram dos primeiros.

" Agora, Senhor meu - disse Flambeau ovante –

Vereis quando passar a nobre Infantaria...

Tenho medo que o sol estoire e finde o dia

E a noite eterna envolva a Terra num instante.

Serão aclamações estrondosas torrenciais,

Vibrarão no azul qual doida trovoada,

Verseá a multidão frenética, entusiasmada,

Delírio igual jamais se viu, jamais."

Surgiram a seguir os homens das trincheiras,

Alpinos, caçadores e toda a infantaria.

Nas suas expressões claramente se lia

O martírio sofrido e angústias e canseiras.

Quando o canhão, rugindo, a morte semeava,

Impávidos, no posto, assim permaneciam...

Era uma coorte altiva, os tantos que ali iam,

Um grande, imenso, mar de heróis que ali passava.

Às quentes saudações que a multidão soltou

Silêncio se seguiu, silêncio e nada mais.

O espanto avassalou as regiões siderais.

E Flambeau, indignado, agreste se expressou:

-"Assim os recebeis, ó crua, ingrata gente?!

Por vós riram da morte e a fome desdenharam,

Cansados de sofrer jamais o confessaram,

São de aço os quais ali vão, tropa digna, valente!

Deveislhe orgulho, sim, a graça de viver,

E, em vez de os abraçar, calaivos? Mal andais.

Franceses, ouvi bem: Sois rudes, sois brutais,

Tamanha ingratidão não tem razão de ser."

Mas mal termina a frase, olhando a Terra, fica

Possuído de orgulho, o coração em festa...

Os Infantes, semideuses, heróis em gesta,

Que a luz do sol poente envolve e magnifica,

Marcham erectos, viris, o olhar altivo e ousado...

Fremente, perturbada, a imensa multidão,

Por um alto mandato ou estranha inspiração,

Havia ajoelhado.



LUCIAN BOYER Adaptação livre do Cap. J.M. Galhardo

O PAPA E O PRESERVATIVO

Segue-se um comunicado que a Associação Ateísta Portuguesa remeteu à comunicação social:

Assunto: A viagem de Bento XVI a África


COMUNICADO

À Comunicação Social

Bento XVI declarou, no início da sua primeira visita ao continente africano, que "não se resolve o problema da SIDA com a distribuição de preservativos" e que, "pelo contrário, (a sua) utilização agrava o problema".

A Associação Ateísta Portuguesa (AAP) repudia solenemente estas graves e falsas afirmações e, sabendo que 67% das pessoas infectadas com SIDA vivem na África subsariana, lamenta a viagem do Papa católico a África e os consequentes prejuízos irreparáveis na luta contra a dramática epidemia.
Estas afirmações do Papa, ao arrepio dos conhecimentos científicos, em colisão frontal com as recomendações dos organismos internacionais, nomeadamente a OMS, e com grave prejuízo dos esforços das autoridades sanitárias para debelarem o flagelo, contribuem para tornar mais dramática a situação e mais difícil o seu controlo.
Com estas palavras, a visita do Papa a África torna-se numa calamidade que contribui para a degradação das condições sanitárias e para o recrudescimento da epidemia da SIDA. As crenças de Bento XVI contrariam os conhecimentos epidemiológicos e as suas declarações agravam os perigos de comportamentos sexuais de risco e da propagação da SIDA.
A reprovação do preservativo, o meio mais eficaz de prevenção das doenças sexualmente transmissíveis, é moralmente injusta e cientificamente insustentável. Ao defender dogmas religiosos sem considerar a tragédia humana que daí resulta, o Papa declara-se como um dos responsáveis pelo agravamento da epidemia e pela sabotagem dos esforços dos organismos de combate à SIDA.
Deste modo, a AAP condena, em nome da paz, da liberdade e da felicidade humanas, o comportamento imoral do Papa e apela a que a representação do Vaticano nas organizações internacionais de saúde seja suspensa até à retractação, sem subterfúgios, destas alegações inadmissíveis.
Finalmente, a AAP exorta a Conferência Episcopal Portuguesa a demarcar-se das infelizes e graves afirmações papais sob pena de se tornar cúmplice da sabotagem no combate à SIDA.


Bastavam a África a fome, as epidemias e o tribalismo. Era escusada a viagem papal.


Associação Ateísta Portuguesa – Odivelas, 06 de Março de 2009

Carlos Esperança

(Presidente da Direcção)



2009-03-18

SÓ ELE É QUE NÃO VÊ...


... que a contestação cresce por todo o lado

A caminho dos Camarões
Papa afirma que a sida não se combate com preservativos.

França condena declarações do Papa sobre o preservativo.


De que é que esta luminária estará à espera, para apresentar o pedido de demissão? Estará à espera de alguma encomenda de vergonha, já que ele não tem nenhuma? Ou estará convencido de que tem de apresentar o pedido de demissão ao "patrão"? Mas ele sabe perfeitamente que o "patrão" não existe. E a prova está aqui: se ele existisse, já teria mandado o Ratzinger fazer qualquer coisa de útil. Se é que o pastor alemão sabe o que é isso...

2009-03-15

MAIS UM MILAGRE (ANTECIPADO) EM FÁTIMA

Sem a menor vergonha pelo "roubo", aqui vai mais uma maravilha literária que encontrei no
Diário Ateísta
.

COISAS DA ICAR...

1) - Bispo de Coimbra pede oração para avançar canonização do Padre Américo.
Olha... e eu a pensar que o "pastor alemão" é que decidia esas coisas... Se calhar enganei-me. Essa coisa das canonizações, afinal, dependem de Deus. Tem que haver milagres, e mais não-sei-quê. Bem, acho que isso não é difícil, e nem será preciso rezar muito. Afinal, milagres há-os todos os dias. Basta dizer que foi o padre Américo que o fez, e... "voilá". Só que não vale imitar. Por exemplo, a cura do olho já está atribuída ao Nuno Álvares. Por isso, eu acho que o melhor era o padre Américo fazer outro milagre qualquer. Ele, na qualidade de cadáver, tem todo o tempo do mundo para decidir. O bispo de Coimbra é que parece estar apressado...
Que tal arranjar políticos decentes para nos governar? Ou melros brancos, que é parecido... Têm em comum a raridade.
2) - Papa quer «tomar nos seus braços» toda a África
Bem, o homem é ambicioso, não se pode negar. Logo TODA a África!!!
Das duas, uma; ou o rapaz está convencido de que África quer dizer Angola e Camarões, ou acha que África é um país. Alguém devia dizer-lhe que em África há, além de outros, países como Egipto, Marrocos, Tunísia e Líbia. Que, de certeza, não querem ser "tomados nos braços" de Ratzinger. Acham-se muito bem nos braços de Maomé...

2009-03-08

FOI VOCÊ QUE PEDIU UM "PAÍS LAICO"?

Com a devida vénia (e sem qualquer pingo de vergonha) aqui vai o "copy/paste" de um artigo publicado hoje no "Diário Ateísta", na autoria de Carlos Esperança:

A Assembleia da República já foi o coração da democracia. Na última sexta-feira foi a sucursal da Conferência Episcopal. Deixou de ser Parlamento e passou a ser um charco de água benta onde a maioria dos deputados rubricou de joelhos o milagre que o Papa adjudicou a Nuno Álvares Pereira.

O PCP absteve-se e só o Bloco de Esquerda votou contra e teve a decência de censurar o CDS por querer pôr – e pôs – o Parlamento «de uma república laica a reconhecer a cura milagrosa das lesões do olho esquerdo da D. Guilhermina de Jesus, sofridas pelos salpicos do óleo de fritar o peixe, para o qual invocou a intercepção do beato Álvares Pereira».

Portugal não é um País, é um pântano onde medra a fé e a superstição, um protectorado do Vaticano onde faltam cidadãos e sobram crédulos, um sítio beato onde se treme com medo dos báculos, se ajoelha quando aparecem mitras e se afocinha à vista do anelão com ametista que ornamenta os dedos dos senhores bispos.

Que o CDS, nostálgico do salazarismo e da cumplicidade com a Igreja, proponha um voto de congratulação pela canonização de D. Nuno, compreende-se. Paulo Portas gosta de rastejar nas igrejas para mostrar aos eleitores que crê nas cambalhotas que o Sol deu na Cova da Iria, nas visões da Lúcia e no anjo que aterrou no anjódromo de Fátima.

Do Presidente da República, da sua débil cultura e do passado como primeiro-ministro, em que sancionou a censura d’O Evangelho segundo Jesus Cristo, de Saramago, feito pelo sub-ajudante de ministro, Sousa Lara, podia esperar-se o indecoroso regozijo, em nome de Portugal, mas do PSD é um ultraje à decência. Estariam os senhores deputados convencidos de que o olho da D. Guilhermina foi curado por um acto de corrupção divina feito pelo defunto D. Nuno?

Mas o mais indigno dos partidos foi o PS. Um partido republicano, laico e socialista que rasgou a sua tradição e se tornou cúmplice de uma burla pueril, perdeu a referência ética que o faz respeitável e ajoelhou-se com a D. Matilde Sousa Franco e a D. Maria do Rosário Carneiro, ornamentos pios, para colaborar numa farsa e fazer coro com os que garantem que D. Nuno passou de Condestável a curandeiro.

O "DIA INTERNACIONAL DA MULHER"

Hoje, comemorou-se o Dia Internacional da Mulher. Que eu festejei, naturalmente. Aliás, esta coisa do dia internacional disto ou daquilo é um dia que eu festejo sempre. Foi um tique que me ficou dos tempos da caridadezinha salazarenta. E um dia não são dias.
Claro que o "dia Internacional da Mulher" não tem nada a ver com a tal caridadezinha. Nos tempos da outra senhora, as mulheres não tinham direitos. Com excepção naturalmente, dos direitos de: 1) estar sempre disponível para o marido; 2) levar porrada de vez em quando; 3) Ter sempre cerveja fresca no frigorífico; 4) Ter a comida sempre pronta a horas de o marido nunca chegar atrasado à taberna ou à partida de "sueca"; 5) etc, etc, etc, mas sempre neste sentido.
Mas os tempos mudaram; e hoje, a mulher tem, para além dos direitos já enumerados, mais o direito a votar. Foram grandes, as conquistas que a mulher alcançou ao longo dos tempos, desde o "25 de Abril". Hoje, essa coisa de o homem ser superior à mulher não passa de um sonho do passado. A mulher ganha, em geral, menos que o homem, mas a igualdade é uma conquista inalienável e irreversível (pelo menos para já). Leva tareia na mesma, mas também não se pode ser muito exigente, pois estamos em democracia. E, principalmente, conquistou o direito a ter um "Dia Internacional". O que coloca a mulher a milhas de distância do homem que, desgraçadamente, nem direito tem a um miserável "Dia Regional".
Por isso, e como acima disse, eu festejo sempre estes "dias". sejam eles internacionais ou nacionais: dia do idoso, da criança, do deficiente, do avô, da avó, do pai, da mãe, do tio, da tia, e por aí fora. Sempre dá para lavar a consciência. E as mulheres nem se podem queixar: podem apanhar porrada, ser maltratadas, tratar do marido e dos filhos, estourar os miolos na gestão da contabilidade doméstica. Mas têm um "Dia Internacional".
Por isso, hoje levei a minha mulher a jantar fora. Para comemorar.
Mas foi ela que pagou a despesa. E eu não lhe quis negar esse prazer...

2009-03-05

DEUS E A EVOLUÇÃO

Segundo a «NBC» o Cardeal William Levada, o actual Inquisidor-Mor, que é como quem diz o presidente da Congregação para a Doutrina da Fé» afirmou do alto da sua autoridade eclesiástica que embora acredite na Evolução, em última análise não Deixa de ser Deus o criador de todas as coisas. (In "Diário Ateísta")

Comentário:

Posso dizer com toda a franqueza que esta atitude da ICAR não me espanta, por esperada. Na verdade, ao longo dos séculos, a ICAR (e congéneres) tem vindo a proclamar as "suas" verdades mas, quando acossada por factos indesmentíveis, acaba por aceder. No entanto e nos "finalmentes", coloca sempre Deus em acção. Ou o Demónio, conforme dá jeito. Newton descobriu a lei da gravidade? Sem dúvida, mas não esqueçamos que a gravidade foi criação divina. A gravidade e a gravidez, não esqueçamos. O casal Curie descobriu o rádio? Inegável, mas foi Deus que inventou essa coisa. E por aí fora. Por isso, depois de, durante este tempo todo, terem negado a Evolução, acabam por admití-la. Mas, não esqueçamos: a Evolução existe, mas é obra de Deus.
Porra, que não há pachorra!!!

2009-03-04

A JORDÂNIA EM BREVES PINCELADAS (Parte II)


Uma das coisas que aprendi nesta profissão de turista (que é uma profissão ingrata, fiquem a saber), é que se deve descontar cerca de 97,2% àquilo que os guias afirmam.
Por exemplo, logo no primeiro dia de visita à Jordânia, fomos encaminhados para Monte Nebo, em Mádaba (مادبا) onde, segundo nos venderam (nós comprámos) Moisés teria avistado a Terra Prometida, seja isso o que for. Mas nunca teria lá chegado, já que morreu no Monte Nebo. Ora, cabe perguntar: se, a ser verdade, Moisés morreu cerca de 1250 anos antes da Era Comum, o que andam a fazer os arqueólogos, que conseguem encontrar vestígios de dinossáurios extintos há milhões de anos, e não encontram ossadas dos hebreus que, durante quarenta anos (dá direito a três gerações, feitas as contas) vaguearam pelo deserto? Bom, mas deve ser verdade, uma vez que até lá puseram o "bordão de Moisés" (suponho que foi aquele que serviu para abrir o Mar Vermelho). Claro que o guia, com a honestidade que, em geral, caracteriza todos os guias, sempre foi avisando que há mais países que reivindicam a presença e morte de Moisés nas suas terras... O que me leva a concluir que, afinal, todos os guias falam verdade, Moisés é que tinha o poder da ubiquidade.
Apesar de ser um país relativamente novo, com independência declarada em 1946, a Jordânia já aprendeu que o turismo religioso dá muito mais dinheiro que o turismo de lazer. Ou seja, são muçulmanos mas não são parvos. O Monte Nebo está quase transformado em santuário, e em Betânia onde, segundo se assegura, Jesus - por alcunha "O Cristo" - foi baptizado, vai ser equipado com uma unidade para acolher peregrinos. Que, sinceramente, eu não vi. Provavelmente porque não há (ainda) a tal unidade de apoio. Ora, uma pesquisa pela "net" diz-nos que não há a certeza quanto ao local de baptismo; e a confirmar esta incerteza, há uma agência de viagens que promove uma excursão à "terra santa", com visita a Betânia - local onde jesus foi baptizado. Aliás, o honesto guia já tinha avisado que os israelitas também tinham uma Betânia mas, tal como acontece com as religiões, esta Betânia (à esquerda) é que é a verdadeira. Isto não obstante a Wikipédia informar que Betânia se situa em Israel.
Curiosamente, os muçulmano0s aceitam Jesus, não como filho de Deus mas como um profeta, tal como Maomé. Aliás, eles aceitam todos os profetas bíblicos, o que se compreende, pois o Alcorão mais não é do que uma cópia foleira da Bíblia. Tal como os cristãos, os islâmicos acreditam que Jesus virá, um dia, não para salvar a humanidade mas para salvar o mundo. Jesus, segundo eles, não morreu na cruz; quem morreu foi outra pessoa no lugar ele. Jesus subiu ao céu, o que deve estorvar um pouco. Temos Jesus, Maria, que foi levada por dois anjos, e Maomé. Acho que já há pessoas a mais num lugar que era, em princípio, destinado às almas puras.
Mas isto, claro, é a minha opinião...

2009-03-01

A JORDÂNIA EM BREVES PINCELADAS

Islão 1 - A Jordânia é um país islâmico, e isso não é novidade para ninguém. Por isso, não é de admirar que um jordano seja metido na prisão se for encontrado a consumir bebidas alcoólicas em público. Suponho que em privado pode, porque ninguém vê.
Islão 2 - Por curiosidade perguntei ao guia como lidavam com o ateísmo - isto é, com os ateus. Olhou para mim como se eu lhe tivesse perguntado se havia homenzinhos verdes am Marte. Acabou por responder: "Sabe, as leis são muito rigorosas..." E mais não disse. O resto concluí eu, sem ajuda: Não há ateus. Têm de acreditar, quer queiram quer não. Apesar disso, há comunidades católicas ortodoxas. Toleradas. Mas não são ateus.
Islão 3 - Não vi "burqas". Mas vi mulheres que usavam o "hijab" (à esquerda) ou o "niqab" (à direita). A Jordânia pareceu-me moderadamente fundamentalista (perdoem o oxímoro), por isso fiquei admirado por ver algumas mulheres com o "niqab". Se "lei é lei", todas as mulheres deviam usar o "niqab" ou o "hijab". Será que dá direito a escolher? O guia, minha vítima de eleição, elucidou-se a medo: o "hijab" é obrigatório; o "niqab" é facultativo. Pode ser usado por mulheres mais fundamentalistas... "Ou quando o marido manda", acrescentei eu. "Sim, se o marido mandar..."
Ciumentos compulsivos, estes muçulmanos.
- Na Jordânia não há petróleo. Oficialmente, claro. Porque parece que há... Aliás, nem se compreenderia que, num país rodeado de petróleo por todos os lados, o subsolo estivesse seco. Mas uma reserva estratégica é sempre aconselhável.
- Por isso, os jordanos (leia-se as autoridades jordanas) insistem que o único petróleo é o turismo. O turista é sagrado, garantem. Mas não se ficam pelas palavras. Vejam só:
Episódio 1 - O nosso autocarro seguia em direcção à cidadela de Amã. Transito intenso, e um chico-esperto que resolve mudar de direcção. Resultado: o autocarro embate no ligeiro. Só chapa, com amolgadelas do tipo curável com betadine.
Episódio 1-A - Em menos tempo do que leva a contar, surge um polícia. Rapidamente, trata de desviar o trânsito.Apercebe-se de que se trata de um autocarro com turistas. Imediatamente, pelo telemóvel, contacta a central, que coloca uma ambulância em alerta. Mas não houve feridos. "Para onde iam?" "Para a cidadela". O autocarro tem de ficar imobilizado, e o grupo tem de seguir de táxi, pois "the show must go on". O polícia, ao mesmo tempo que orienta o trânsito, vai mandando parar os táxis vazios. Aos poucos, o grupo desloca-se para a cidadela.
Acabada a visita, o grupo espera pelo autocarro. Outro autocarro. "Porquê?" perguntei ao guia. "Porque o anterior, junto com o motorista, foram para a central de polícia, acompanhados pelo outro veículo interveniente e respectivo condutor. O acidente dá lugar a um inquérito rigoroso, uma vez que um acidente com um autocarro de turistas pode levantar a suspeita de atentado".
Allah não brinca em serviço... E a polícia também não, ao que parece.
Episódio 2 - Rua Zahran, à noite. Em Amã existe um viaduto que o governo dos EUA mandou construir propositadamente, para que o embaixador não tivesse de parar nos semáforos (!!!) quando se dirigisse à Embaixada. Dada a beleza desse viaduto, e a sua vista privilegiada sobre o centro da capital, decidimos ir até lá. Não sabíamos se se podia atravessar a pé, pelo que nos dirigimos a dois polícias postados de serviço ao palácio do chefe do governo, um pouco mais abaixo do hotel. Pelos vistos também não sabiam, já que nos informaram que a ponte também era pedonal (não é). Levantava-se um problema: atravessar a movimentada Rua Zahran, com duas faixas de rodagem e três vias em cada sentido. Vagueamos um pouco, à procura de uma passadeira. Um dos polícias aproximou-se. Perguntou se queríamos atravessar. Dissemos que sim. O polícia entrou no meio da rua, mandou parar o trânsito. Chegámos ao separador central, e o polícia fez o mesmo na outra faixa de rodagem. Atravessámos calmamente.
Turista é mesmo sagrado, porra!!
Por falar em turismo... Eu sei que estávamos num país muçulmano. Mas não é admissível que num hotel de 4 estrelas se apresentem, ao cliente, chávenas esbotenadas. Além disso, o serviço é lento mas, contraditoriamente, se um cliente se distrai, levantam-lhe o prato da mesa, ainda com comida. Basta que pouse os talheres enquanto mastiga.
A mim, uma vez, e enquanto ia buscar a sobremesa, levaram-me o prato, os talheres e o guardanapo. Felizmente que foi tudo devolvido.
Petra - Podemos dizer que é o símbolo da Jordânia. Isso, aliado a uma propaganda que (justamente, entenda-se) a blogosfera proporciona, torna a Jordânia um destino de sonho. Mas... O que tem Petra, de especial? Beleza?Nem por isso... Quer dizer, não tem mais beleza do que qualquer monumento da antiguidade grega ou romana. Então, o que atrai tanta gente a Petra? O que leva as pessoas a calcorrearem quase cinco quilómetros para ver Petra? Por favor, não me perguntem, porque não sei responder. Há um misterioso fascínio que faz com que não se consiga sair indiferente, de Petra. À medida que caminhamos em direcção à cidade, sente-se como que um estado de ansiedade crescente, que culmina com a frase, várias vezes repetida: "A célebre fenda!!!" Os Nabateus, fundadores da cidade, desviaram um rio para poderem construir Petra. E é ao longo do antigo leito desse rio, entre rochas que chegam a atingir cerca de cem metros de altura, que se caminha até à cidade sagrada de Petra, que se manteve escondida durante mais de mil anos.

Mas a verdade é que a Jordânia não é, apenas, Petra. A Jordânia não parece ser rica em monumentos, e a paisagem não é deslumbrante. Pelo menos nos termos em que consideramos "deslumbrante", embora os desertos causem assombro pela magestade de algumas formações rochosas. Não são permitidas visitas de "infiéis às mesquitas, o que poderia dar algum sabor à visita. Nota-se que os serviços de turismo fazem um esforço enorme para "ocuparem" o turista durante os seis dias de estada. Visitas aos corais do Mar Vermelho em águas poluídas do porto de Aqaba ou um banho tardio no Mar Morto, são alguns dos ingredientes com que se tenta "apimentar" a permanência. No entanto, a pouco menos de 200 quilómetros de Amã, encontram-se o castelo de Ajloun e a cidade antiga de Jerash, forte e bem conservado vestígio da ocupação romana, com um surpreendentemente belo teatro, possuidor de uma acústica maravilhosa. Infelizmente, o mau tempo não nos permitiu uma visita completa, como Jerash merecia.

Não me apercebi de sinais de pobreza. Quero dizer, daquela pobreza a que estamos habituados quando visitamos certos países. Não vi pedintes, mesmo nos locais mais frequentados pelos turistas. Claro que isto pode não significar nada: basta que a polícia proiba a exibição de sinais exteriores de pobreza. Porque na verdade, nas conversas com o guia este não deu indicações de abundância financeira, embora o parque automóvel se apresentasse novo. Digamos que, tal como cá, há ricos e pobres.
O que não impediu o falecido rei Hussein de ter tantos automóveis que permitiram criar um museu que é, apenas, o maior museu automóvel do mundo. Aliás, Hussein era conhecido (também) pela sua paixão pelos desportos motorizados.

Por tudo isto, quero dizer que não vale a pena uma viagem à Jordânia? Calma, eu não disse nada disso! Claro que vale a pena. Porque uma viagem não se fica pelos monumentos ou pelas paisagens. Há a gastronomia, os costumes, as tradições, o povo. O povo jordano é hospitaleiro e simpático. A cada passo nos pediam para serem fotografados connosco e, contrariamente ao que tenho visto noutros países muçulmanos, não se "faziam" à gorgeta.
E depois, uma viagem é sempre uma viagem. Nem que seja ir a Espinho e voltar.