2011-10-25

Milagres...

A cada passo somos confrontados com fenómenos inexplicáveis – ou convenientemente deturpados de modo a dificultar a explicação. Ou é o olho da D. Guilhermina que se cura milagrosamente graças à intercepção de D. Nuno Álvares, ou é uma freira que, milagrosamente, vê a sua doença de Parkinson desaparecer, ou é uma mulher que vê regredir um cancro na garganta.
Quando a ciência não pode – ou não sabe, que a ciência não sabe tudo e ainda bem, acrescento eu – explicar os fenómenos, aparecem os aproveitadores do costume a berrar que nem ovelhas desmamadas, “milagre, milagre!”.
Era assim nos primórdios da Humanidade, quando o Homem foi confrontado com fenómenos na altura inexplicáveis; foi assim que nasceram os deuses, posteriormente reunidos num só, suponho que por razões económicas.
Em resumo: quando ocorre um fenómeno inexplicado, é milagre. E o presumível autor do “milagre” começa a percorrer o rápido caminho para a santidade
Ponto final.
A televisão tem-nos dado conta de uma senhora que deu à luz uma criança que nasceu sem uma das mãos. Hoje mesmo, perante as câmaras, a senhora afirmava ter tido uma gravidez e um parto normais, e que a ciência não encontrava explicação para o fenómeno.
Estão, pois, creio eu, reunidas as condições para que o fenómeno seja considerado milagre, e para a senhora ser beatificada. Ou santificada, sabe-se lá… Com a vantagem da originalidade: o milagre deu-se com a autora ainda viva, não deixando margem para dúvidas ou especulações, enquanto os outros têm ocorrido com os presumíveis autores já defuntos, não podendo haver certezas quanto à autoria. Só suposições.
A Congregação Para a Causa dos Santos está à espera de quê? De que a senhora morra?

2011-10-23

ESTÁ NA LEI...

Ultimamente, a sociedade tem vindo a ser sacudida com o conhecimento de escandalosas prebendas auferidas por alguns governantes e/ou figuras cimeiras de cargos públicos. Ainda não se tinham apagado os ecos das auto-promoções e consequentes aumentos salariais de altos responsáveis da PSP, e eis que nos chega a notícia de que alguns governantes, entre eles o ministro da Administração Interna, recebem subsídio de renda de casa - não obstante o possuírem casa própria na Capital. No primeiro caso, até houve tentativa de camuflar o acontecimento, mas sem sucesso.
Pois bem, quando questionados, o que dizem estes responsáveis(?)? Que "está na Lei". Aliás, ainda hoje o MAI dizia, na televisão, que iria renunciar ao subsídio "que a lei" lhe concedia. 
Ó senhor ministro: que está na lei, toda a gente sabe! Já chega de tratar os portugueses como atrasados mentais. Mas não seria conveniente dizer, aos portugueses, que foram vocês que fizeram essa lei? Tal como fizeram outras para vosso benefício?
Já agora: sabia que os subsídios de Natal e de férias que vão ser roubados aos funcionários públicos no activo e na aposentação também "estão na lei"? E que os vencimentos e as pensões que vão ser cortados também "estão na lei"? Não sabia, certamente. O que se compreende, o senhor está há pouco tempo no governo, não é obrigado a conhecer as leis todas. Basta que conheça as que o beneficiam.
Um bocadinho de sentido ético, e não viria mal ao mundo.

2011-10-16

OS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS, ESSES RICALHAÇOS...!


Confesso, desde já, que sou suspeito: não votei no partido do governo, logo, nada tenho a ver com a escolha deste primeiro-ministro. Não obstante, e na minha qualidade de ingénuo compulslivo, senti uma réstia de esperança, quando Pedro Passos Coelho foi escolhido para chefiar o governo.  Sabia que dias difíceis viriam, mas pensei que, pelo menos, ficávamos em boas mãos, em termos de honestidade intelectual, fartos que estávamos (os que estavam…) das mentiras do outro.
Afinal, só as moscas mudaram.
José Sócrates tinha diabolizado tudo quanto era função pública, só lhe tendo faltado dizer que os funcionários públicos eram os causadores da crise. Mas se José Sócrates dizia mata, Pedro Passos Coelho diz esfola.
Afinal, os funcionários públicos não só são responsáveis pelo buraco financeiro, e só assim se compreende que tenham sido eles os eleitos para tapar esse buraco, como também são ricalhaços. Sim, senhores: os funcionários são ricos como o caraças, que até ganham, em média, 10 a 15% mais que o sector privado.
Essas médias são conhecidas. São como a história do frango: se eu comer um, e tu não comeres nenhum comemos, em média, meio frango cada um. E é sabido onde é que Pedro Passos Coelho foi buscar essa média. É simples: um piloto da TAP é capaz de ganhar mais do que um piloto da RyanAir, por exemplo; uma chefia da CP é capaz de ter mais prebendas do que o chefe de secretaria do Barraqueiro ou da Resende; provavelmente, um administrador de um qualquer hospital privado ganhará menos do que um administrador de um hospital público ou EPE. Etecetera, que os exemplos abundam (infelizmente). Mas esses são uma minoria. São uma minoria mas, mesmo assim, suficientes para alterar toda a estatística: eles é que comem o frango... Aliás, é consabido que Portugal está entregue, em termos de tachos e gamelas, a uma minoria. E não é essa minoria que vai pagar os sucessivos buracos. Pelo contrário, o seu dever é cavar ainda mais fundo.
Adiante.
Quanto ganha um professor do público, e quanto ganha um do privado? Quanto ganha um médico do público, e quanto ganha um do privado? E um enfermeiro? E um motorista? E um escriturário? E um Assistente Operacional de Fluxos Humanos, vulgo porteiro? São estes, senhor primeiro-ministro, que fazem a função pública. Não são os outros. Porque são estes que trabalham, se esforçam, que aturam chefes com problemas domésticos, e/ou psicológicos e não têm telemóvel pago, nem gasolina grátis, nem cartão de crédito ilimitado (alguns, nem limitado), nem automóvel do Estado (pago por nós).
Um pouco de honestidade intelectual só lhe ficava bem, senhor primeiro ministro; para mentiroso, já tínhamos o outro. Então, deixava-o ficar. Já estávamos habituados.