2010-03-31

CARTA AO BISPO

Com a devida vénia, transcrevo uma carta que a Associação Ateísta Portuguesa escreveu ao Bispo Carlos Azeredo.

Exmo. Senhor

Bispo Carlos A. P. M. Azevedo

A/C da Secretaria da CEP

secretaria.cep@ecclesia.pt

Casa Patriarcal

Quinta do Cabeço – R. do Seminário

1885-076 – MOSCAVIDE

Senhor bispo Carlos Azevedo


A Associação Ateísta Portuguesa (AAP) compreende a preocupação da Igreja católica com o ateísmo, a ponto de ter realizado a peregrinação de 13 de Maio de 2008, a Fátima, «contra o ateísmo na Europa» e de, no mesmo ano, o Sr. Patriarca Policarpo ter considerado o ateísmo como o «maior drama da humanidade», maior ainda que a fome, as doenças, as guerras, as catástrofes naturais, a pedofilia e o terrorismo religioso. E a AAP reconhece, e defende, o direito de V. Ex.ª e da sua Igreja de não gostar de ateus e de manifestar o azedume que esta associação lhes tem causado nestes escassos dois anos que leva de existência.


Compreendemos também o nervosismo que a exposição mediática a que estão submetidos, pelas piores razões, perturbe a serenidade e suscite reacções menos ponderadas, como as que V. Ex.ª e os seus colegas João Alves e António Marcelino têm assinado em artigos de opinião respectivamente no Correio da Manhã, no Diário de Coimbra e no Soberania do Povo, de Águeda, contra a AAP e o seu presidente que, desde o dia 27 pp., entraram no segundo mandato.


Lamentamos no entanto que não nos seja reconhecido o direito ao contraditório. Talvez porque a liberdade de expressão não seja uma virtude teologal e a liberdade religiosa só tenha sido admitida pela Igreja católica no Concílio Vaticano II, na segunda metade do século XX, e mal digerida pelos dois últimos pontificados. Infelizmente, no século XXI, a opinião de quem diz falar em nome dos deuses é ainda tida em mais conta que a de quem admite pensar por si. É por isso que lhe dirigimos esta carta, mantendo no entanto a esperança de que o diálogo possa ser mais simétrico no futuro.


Tendo o presidente da AAP, a título pessoal, considerado "inoportuna" a vinda do Papa Bento XVI a Portugal no próximo mês de Maio, o Sr. bispo Carlos Azevedo declarou à Agência Lusa que
"São 70 pessoas. Acho que têm o direito a ter a sua opinião, mas é uma opinião muito reduzida do conjunto da população portuguesa, que está a vibrar e a preparar-se para a visita do Santo Padre", afirmações reproduzidas pela Rádio Renascença e pela SIC.

Embora a validade das posições não seja proporcional ao número de pessoas que as perfilham, aproveito para informar o Sr. Bispo Carlos Azevedo que a Associação Ateísta Portuguesa conta com 111 sócios fundadores, aos quais se têm juntado cada vez mais portugueses que, não professando qualquer religião, nem têm tempo de antena na TV pago a expensas do Estado nem a mesma facilidade de ter a sua opinião divulgada pela imprensa.

Além disso, relembramos que o Papa é o líder da Igreja Católica e de nenhuma das outras religiões. No número de portugueses que não vibra com as despesas causadas pela visita deste “Santo Padre” temos de contar não só todos os ateus e agnósticos como também todos os fieis de religiões que não a católica. Um total consideravelmente superior aos 70 que o Sr. Bispo tão precipitadamente estimou.

Assim, a AAP insiste na sua oposição a qualquer apoio do Estado português a uma visita de proselitismo, a qualquer acto de subserviência dos órgãos de soberania e a qualquer manifestação que ultrapasse o protocolo devido a um chefe de Estado, direito que os Papas usufruem depois do tratado de Latrão assinado com Benito Mussolini. E reiteramos que a visita deste Papa, nesta altura, é pouco apropriada pelas suspeitas graves que pairam sobre a Igreja Católica.

Ao contrário do que afirma o Sr. Bispo Carlos Azevedo, o problema não é “os falhanços de alguns membros do clero”, um termo especialmente infeliz por sugerir que terão falhado mas que visavam o alvo certo. O problema foi a Igreja Católica ter conspirado durante décadas para encobrir estes crimes, proteger os criminosos, não travar os abusos e negar sistematicamente a justiça que as vítimas exigiam. Isto não foram falhanços mas sim um sucesso estrondoso num acto hediondo. E estando a hierarquia católica implicada até ao mais alto nível, manda a prudência e o respeito pelas vítimas que se apurasse primeiro as responsabilidades antes de prestar honras aos suspeitos.


Aproveitamos para apresentar a V. Ex.ª os nossos cumprimentos e para reiterar a defesa do direito à crença, descrença ou anti-crença de qualquer cidadão.

Associação Ateísta Portuguesa
Odivelas, 31 de Março de 2010

2010-03-14

PAGAMOS, OU NÃO PAGAMOS?


De vez em quando, a "net" traz-nos coisas curiosas. Ele é mensagens a alertar para vírus descobertos "ontem", mas que circulam (as mensagens) há mais de dois anos, ele é pedidos de sangue, ele é criancinhas queimadinhas, coitadinhas, etc, etc. A última que me apareceu garantia, preto no branco, que as entradas (vulgo "couvert") que nos são servidas no restaurante, desde que não sejam encomendadas não devem ser pagas - mesmo que consumidas. A mensagem referia um parecer do jurista Mário Frota, e remetia para a Lei 24/96, de 31 de Julho, designadamente o artº 9º n.º 4 (4 - O consumidor não fica obrigado ao pagamento de bens ou serviços que não tenha prévia e expressamente encomendado ou solicitado, ou que não constitua cumprimento de contrato válido, não lhe cabendo, do mesmo modo, o encargo da sua devolução ou compensação, nem a responsabilidade pelo risco de perecimento ou deterioração da coisa.
Por regra, quando me aparecem mensagens deste género, ou do tipo "o povo é quem mais ordena" ou, ainda, "não pagamos, não pagamos", começo logo por desconfiar do tamanho da esmola. E sigo um de três caminhos: ou a mensagem não tem ponta por onde se lhe pegue, e vai directa para o lixo; ou a mensagem merece toda a credibilidade e eu entendo que os amigos merecem uma boa notícia de vez em quando; ou a mensagem me deixa dúvidas e, nesse caso, trato de perguntar a quem sabe mais do que eu. Pelo que, perante esta mensagem, e porque neta aparece o nome do conceituado Mário Frota, perguntei à DECO, da qual sou sócio. Gente impecável, aquela, telefonaram-me para o telemóvel e tudo! Para dizer, em resumo:
  1. As entradas não foram encomendadas, e o seu preço não aparece na ementa: pode partir do princípio de que são oferta da casa e, nesse caso, não é obrigado a pagá-las, mesmo que as consuma.
  2. As entradas não foram encomendadas, mas o seu preço aparece na ementa: deve pagá-las, se as consumir.
Ou seja, não é tão linear como aparece na notícia e, à boa maneira "tuga" a interpretação que se dá é "não pagamos, não pagamos". Vamos por partes.
  • No meio do artigo a que faço referência, aparece a frase "ou que não constitua cumprimento de contrato válido", o que é uma chatice de todo o tamanho. O que é um "contrato válido"? Fale com os advogados que entender, que cada um lhe dará uma versão diferente e aceitável do que é um "contrato válido".
Pelo que, como ainda me restassem algumas dúvidas, resolvi consultar o bom-senso. Num dos vários cursos profissionais que frequentei, um dos professores garantia que a lei só se deve aplicar quando falhar o bom-senso. E o que o bom-senso me disse, foi:
  • As entradas nunca são solicitadas. Por norma, aparecem em cima da mesa. Ou já lá estão, ou são trazidas depois de o cliente se sentar à mesa.
  • Quer consumí-las? Força! Mas parta do princípio de que tem de as pagar.
  • Não as quer consumir? Peça ao empregado que as retire da mesa.
  • Verifique se o preço das entradas consta da ementa. Se sim, já sabe quanto lhe vão custar; se não, pode fazer cagaçal porque, nesse caso, está a pagar por um serviço que não faz parte do tal "contrato válido".
Mas trate de ser educado. Avise, calma mas firmemente, o responsável, de que se vai queixar. Depois, chame a polícia. O mais certo é que o homem acabe por lhe oferecer a refeição toda...

2010-03-06

OS AZARES DO JOSEPH




Que o homem anda com azar, não tenhamos dúvidas! Em comparação, Sócrates pode considerar-se um felizardo.
Primeiro, foi a Lei do Aborto; depois, foram os autocarros em Londres, a proclamar que "Provavelmente, Deus não existe"; os escândalos da pedofilia no seio da Igreja; o casamento gay. Mas a cerveja - perdão, a cereja em cima do bolo, estava para vir: no coro que, durante cerca de trinta anos, foi dirigido por Georg Ratzinger, irmão do actual Papa, foram registados casos de abuso sexual de menores.
Com tudo a cair-lhe em cima, quase pode aproveitar a próxima vinda para, num dos encontros com o Sócrates, chorarem ambos, um no ombro do outro.

2010-03-05

"Razões para ser ateu"


Com a devida vénia, transcrevo um artigo de Carlos Esperança, publicado no Diário Ateísta:

Não há a mais leve suspeita ou o menor indício de que deus exista, nem ele, alguma vez, fez prova de vida. Não há qualquer evidência de que exista o ser que os homens criaram à sua imagem e semelhança, onde se notam traços evidentes das tribos patriarcais que há cerca de seis mil anos o inventaram.

Há razões intelectuais para descrer de um deus de que não existe qualquer prova, apesar dos risíveis milagres que lhe atribuem para perpetuar uma crença inculcada, quase sempre na infância, e alimentada pelos constrangimentos sociais e na perpetuação dos medos como mecanismos de manutenção do poder.

São razões morais as mais fortes para que o ateísmo não se transforme numa convicção pessoal silenciosa, pois jamais alguém matou ou foi morto por duvidar do movimento de rotação da Terra ou da lei da gravidade, mas diariamente se mata e morre em nome de um deus verdadeiro que cada crente julga ser o seu. Não há lapidações, fogueiras ou decapitações para quem não acredite numa lei da física ou numa teoria da biologia mas corre perigo quem manifesta dúvidas sobre a sanidade mental dos profetas ou sobre os ensinamentos que cada religião propaga.

Não podemos conformar-nos com o ódio que os sunitas sentem pelos xiitas, os cristãos pelos judeus, os muçulmanos pelos hindus e, todos, por quem não acredita nos poderes invisíveis que controlam o universo.

Temos de ter presente que as religiões monoteístas, cheias de interditos, são herdeiras e guardiãs dos preconceitos morais de uma época mais cruel e intolerante do que hoje. Há, pois, razões morais para nos opormos à vingança, crueldade, violência, espírito misógino e homofobia que as religiões propagam e às relações de poder que desejam perpetuar, nomeadamente à subordinação a que querem submeter a mulher.

2010-03-03

PAGAMOS?

Eu ainda não percebi por que carga de água, benta ou da outra, vou ter de contribuir, sem que nada me tenha sido perguntado, para a construção de um altar. Já me bastou ter contribuído para a construção de estádios de futebol agora às moscas.Quando é que os nossos autarcas, e outras espécies de governantes, conseguem chegar à conclusão de que o dinheiro do povo não é para gastar em folclores religiosos, que só servem para apunhalar a Constituição? Quando é que o Estado se separa, definitivamente, das confissões religiosas? E não venham, por favor, com o chavão de que se trata de um chefe de estado; os chefes de estado vão a recepções, fazem discursos, promovem acordos bilaterais, mas não celebram missas. Se eu quiser uma missa (lagarto, lagarto...) pago-a; não meto a conta ao Estado.
Por outro lado, a Igreja devia ter vergonha; mas duvido que saiba o que é isso. Com os cofres a abarrotar, basta ver os milhões que caem em Fátima, ainda tem a lata de pedir à Câmara o pagamento da construção de um altar... A isto, eu chamo de parasitismo, porque não me lembro de palavrão pior. Mas parasitismo é, afinal, a verdadeira vocação das religiões em geral, e da ICAR em particular.