2012-04-20

O Pogrom de Lisboa


Faz hoje 506 anos.

O dia 19 de Abril de 1506 amanheceu pacífico e soalheiro.
Na igreja de São Domingos, em Lisboa, a missa dessa manhã decorria provavelmente com a calma modorra do costume.
Mas, de súbito, a placidez da missa foi interrompida por um estranho fenómeno que se oferecia perante os olhos de todos os fiéis: a imagem do Cristo pregado na cruz que se encontrava sobre o altar estava iluminada por uma estranha e misteriosa luz.
A superstição e a exacerbada crença dos fiéis imediatamente os fez acreditar estar na presença de um milagre: a imagem do Cristo parecia até que irradiava luz própria.
Todos se ajoelharam em fervorosas preces, em êxtase perante aquele milagre que se lhes oferecia, ali mesmo, à frente dos seus olhos.
Mas há sempre um desmancha-prazeres em histórias como estas: um dos fiéis mais afoitos logo se apressou a explicar aos seus colegas de missa que a luz nada tinha de misteriosa, pois provinha simplesmente do reflexo de uma candeia de azeite que estava ali próxima.
E pronto! Caiu o Carmo e a Trindade!
A primeira coisa que alguém descobriu foi que o chico-esperto era um cristão novo, um judeu convertido à pressa mas, pelos vistos, demasiado depressa.
Foi o suficiente para logo dali o arrastarem pelos cabelos para o adro da igreja, onde foi imediatamente chacinado pela multidão dos fervorosos tementes a Deus, e o seu corpo queimado no local.
O êxtase místico da multidão logo se propagou a toda a cidade.
Lisboa parecia ter ela própria enlouquecido.
Respeitáveis representantes do clero católico saíram dos seus pacatos refúgios de oração e percorriam as ruas de um lado para o outro empunhando crucifixos e gritando: «Heresia! Heresia!».
A multidão depressa foi engrossando e, ajudada até por marinheiros holandeses e dinamarqueses que se encontravam no porto, iniciou uma gigantesca rusga por toda a cidade.
Para evitar o caos e a anarquia, sempre más conselheiras, os padres e frades dominicanos tomaram a piedosa responsabilidade de organizar convenientemente o tumulto: judeu ou cristão-novo que era identificado ou apanhado, era imediatamente preso e levado para o Rossio e ali era queimado em gigantescas fogueiras que os escravos municiavam ininterruptamente de lenha.
Os judeus e os cristãos novos, homens e mulheres, que se refugiavam em casa eram arrancados à força dos seus esconderijos. Até as crianças de berço eram fendidas de alto a baixo ou esborrachadas de encontro às paredes.
Como mesmo nestas coisas da fé é sempre bom juntar o útil ao agradável, o misticismo assassino daqueles fervorosos e bons católicos não os impediu de pilhar as casas por onde passavam e de ajustar velhas contas com inimigos que muitas vezes nada tinham a ver com o judaísmo.
Mesmo os que se refugiavam nas igrejas e se agarravam desesperadamente às imagens dos santos eram levados e arrastados à força para o Rossio e queimados vivos.
A chacina durou dois dias e só terminou por puro cansaço da populaça.
Relatos da época falam no sangue que escorria pelas ruas abaixo no Bairro Alto ou na Mouraria.
Calculam os historiadores que nesta matança em nome dos mais sagrados princípios e da pureza do catolicismo morreram mais de 4.000 pessoas.
Tudo, claro, em nome dessa coisa extraordinária que algumas pessoas têm e que tanto se orgulham de ter, que se chama «Fé».
Tudo feito por bons católicos.
Tudo em nome de Deus.

Carlos Esperança, in Diário Ateísta

2 comentários:

Cleyton disse...

O ser humano tem o direito de escolher em q acretida! A igreja Católica que o Senhor tenha misericordia dela... O seguidores de Cristo (apostolos e cristões (crentes)) entenderam o significado do verdadeiro amor. Eles deram a vida pela palavra da verdade... Jesus Cristo! Infelismente os católicos ñ entendiam esse amor e matavam... pra mim não é espantoso essa chacina. lendo as escrituras essas coisas já estavam profetizadas... isso é incrivel... vc ñ vê verdadeiros seguidores do filho de Deus matar, pelo contrario eles morrem; pela certeza da ressurreição em Cristo Jesus! vc tem o direito de acreditar ou ñ! Mas, a pergunta é: Deus tem culpa dos que dizem o amar e fazem o mal? ex: vc é pai, ensina aos filhos conceitos corretos e dignos e eles te "amam"! ae eles fazem o contrario do q vc ensinou e chegam até matar... quem é o culpado vc ou eles? eles é claro! concorda?
Mudando de assunto,vou te falar uma real... Deus revelou as escrituras para os que criam nele ñ para os q ñ criam! é simples de entender! olha como a palavra do Senhor é interessante: Jesus diz: quem crer e for batizado será salvo + quem ñ crer já esta condenado.
A pergunta é: se os ateus estiverem certos de q Deus ñ exite, então eu estou tranquilo pq nada vai me acontecer. vou morrer e pronto... xau pro louro... + caso Deus exista mesmo... ae vc ta encrencado... pq só existe dois caminhos de o Senhor Jesus... Céu e Inferno... portanto eu estou seguro seja lá qual for a verdade entende... pq eu creio no Senhor, agora vc ñ... então amigo se vc estiver errado, vc esta perdido. já eu ñ... eu ñ gosto de perder! fico sempre do lado vencedor... paz...

Miguel Henriques disse...

Este episódio, o do processo dos Távoras - este nada teve a ver com religião, segundo creio - enfim, são dois de entre muitos episódios que ensombram a nossa História e que nos alertam para o facto de estarmos mais próximos da barbárie do que aquilo que muitas vezes julgamos.