2011-02-25

A ORIGEM DOS SISMOS

Para quem tiver dúvidas...
Para quem não sabe francês:
"As relações sexuais ilícitas na origem dos tremores de terra?
O aumento das relações sexuais ilícitas é a causa do aumento dos tremores de terra, segundo o 'ayatolah' Kazem Sedighi, imã da oração de sexta-feira de Teerão.
«Muitas mulheres mal vestidas» (não respeitando a veste islâmica) «corrompem os jovens, e o aumento das relações sexuais ilícitas faz aumentar o número dos tremores de terra» declarou".

2011-02-15

AI, OS JORNAIS...

O jornal "Sol", na sua edição electrónica, noticia que o "menino multitransplantado" saiu dos cuidados intensivos.
Eu sei - ou julgo saber - que em jornalismo há uma certa "liberdade", em termos linguísticos, principalmente no que a títulos diz respeito; mas há exageros que se devem evitar, principalmente quando põem em causa princípios básicos da língua portuguesa. Que diabo, não temos dinheiro, a nossa soberania é aquilo que a União Europeia deixar, Cristiano Ronaldo e José Mourinho estão ao serviço de uma equipa estrangeira de futebol, o que é que nos resta? A língua portuguesa. E mesmo essa, sabe-se lá o que lhe vai acontecer, com o Acordo Ortográfico (AO).
(Já agora: se um dos objectivos do AO era eliminar as consoantes mudas, o que anda a fazer o H em Homem, Honra, Hora, etc?)
Voltando ao título: O menino não foi transplantado. Muito menos, foi multitransplantado. Ou seja, transplantado várias vezes, coitado do menino! Porque se o foi, o articulista deveria, em prol do rigor informativo, dizer donde foi transplantado, e para onde. Porque, tanto quanto sei, vários órgãos de um menino que morreu foram (os órgãos, atenção) transplantados para o menino que, agora, saiu dos cuidados intensivos. Ou seja, o menino, este, o que está vivo, foi alvo de, ou objecto de, ou sofreu, múltiplos transplantes.
Mas não me consta que tenha sido transplantado. Claro que posso ter andado distraído... Acontece aos grandes génios, por que não haveria de me acontecer a mim?

2011-02-05

A CÁRIE

O senhor Salustiano era um homem de fé. Lembrou-se de que S. Lamberto era o padroei­ro dos dentistas e, por analogia, entendeu ele, dos sofredores dentais. Por isso, saiu do consul­tório e atravessou a povoação em direcção à igreja onde, naquelas circunstâncias de tempo, já pontificava o nosso conhecido padre José dos Santos Passos, segundo o qual os santos são intermediários entre os homens e Deus. Entrou directo na sacristia. Tinha pressa, porque o remédio que o den­tista tinha colocado no dorido dente corria o risco de ficar fora de prazo em curto prazo.

O padre José dos Santos Passos lia o breviário, e mal se sobressaltou quando se deu a entrada, algo bu­liçosa, do senhor Salustiano:

- Boa tarde, caro paroquiano. É sempre um prazer vê-lo na Casa de Deus. Aliás, a si e a to­dos os paroquianos.

- Boa tarde, padre.

Durante o trajecto, o senhor Salustiano delineara uma espécie de estratégia. Santos são san­tos, têm o poder de interceder junto de Deus, mas não é menos verdade que o mortal não pode estar à espera das dádivas divinas sem que haja uma contrapartida. Não é por mero acaso que muitas pessoas palmilham os caminhos até aos santuários, onde depositam os ex-votos – normalmente sob a forma de dinheiro ou objectos valiosos. Por isso, o senhor Salustiano sabia perfeitamente que não podia esperar um milagre e, depois de concedido, ir todo contente para casa como se nada tivesse acontecido. Era o que faltava!

Estava disposto, assim o tinha decidido, a mandar pintar a igreja – aliás a precisar de pin­tura urgente. Bastava, apenas, que aquela cárie dentária desaparecesse por milagre.

- Diga-me, senhor padre: esta igreja tem alguma imagem de S. Lamberto?

José dos Santos Passos sentiu-se algo interdito. São Lamberto? Por que carga de água? Por acaso até nem era um santo com saída, o que estava a dar mais era os chamados “Santos Populares” ou, em alternativa, o S. Gregório, muito solicitado aos fins-de-semana, fora disso era mais santas, tipo Santa Filomena, Santa Maria Madalena... Agora São Lamberto???

- Por acaso não... temos muitas imagens, São Bento da Porta Aberta, São Teotónio, por exemplo...Mas porquê?

- Bom, é que São Lamberto é o padroeiro dos dentistas; ora, sendo padroeiro dos dentis­tas, certamente que não vai deixar de lado os que sofrem de cárie dentária...

José dos Santos Passos interrompeu-o:

- Não tem lógica, a sua dedução, meu filho. Se São Lamberto é padroeiro dos dentis­tas, nunca pode ser, ao mesmo tempo, padroeiro dos sofredores, não é verdade? São interes­ses antagónicos. Se não houver quem sofra dos dentes, não são precisos dentistas para nada. Se São Lamberto é padroeiro dos dentistas, protege-os, nunca poderia proteger os que têm problemas dentários, pois se assim fosse estaria, naturalmente, a prejudicar os dentis­tas. E os santos podem ter os defeitos que quisermos, mas fazem da honestidade o seu pon­to de honra.

Naturalmente empolgado pelo seu discurso, José dos Santos Passos nem se apercebeu da barbarida­de que acabara de lhe sair pela boca fora. Os santos têm defeitos? E são santos? Valha-me Deus!

Adiante.

O senhor Salustiano, no entanto, não se dava por vencido:

- Então diga-me, padre, a que santo terei de recorrer para curar uma cárie dentária?

José dos Santos Passos estupeficou-se:

- ...Uma cárie dentária???

- Sim, padre. Uma cárie dentária. Sabe o que é isso, certamente.

- Claro que sei, se bem que não por experiência própria, graças a Deus. Mas nunca ouvi fa­lar nesse tipo de cura... sinceramente... Quer dizer: pôr paralíticos a andar, pôr cegos a ver, ainda vá que não vá; agora curar cáries dentárias... não me parece. Aliás, repare: só são considerados milagres os factos que a medicina não consegue explicar.

Fez uma muito curta pausa:

- Nunca nenhum santo era capaz de fazer concorrência à medicina convencional, veja lá se compreende! Se a medicina não sabe como curar, aí sim, entram os milagres em acção. Agora, havendo remédio terreno, para quê ir buscá-lo ao Céu?

O senhor Salustiano ainda ficou uns momentos a olhar, hesitante, para o padre. Depois, acabou por se despedir com duas decisões irrevogavelmente tomadas: a primeira, nunca mais pôr os pés na igreja e, pura e simplesmente, tornar-se ateu; a segunda, arrancar o maldito dente. Podia, até, arrancar os dentes todos. Tudo, menos a broca.

Hoje, o senhor Salustiano é proprietário de uma invejável placa dentária com a qual, nos tempos livres e quando está bem disposto, costuma tocar castanholas, batendo com a arcada in­ferior na superior.

Ou vice-versa...


In: "Enquanto As Armas Falavam", de José Carlos Moreira.

Editora "Lugar da Palavra".