2009-07-31

PAGAR, OU NÃO PAGAR?

Com a devida vénia, transcrevo uma mensagem electrónica que acabo de receber.


Exmos. Senhores Directores dos órgãos da Comunicação Social


A Associação Ateísta Portuguesa (AAP) solicita a vossa amável colaboração para dar voz às nossas profundas inquietações com a deriva beata das instituições do Estado e o proselitismo agressivo das Igrejas, nomeadamente da católica, por intermédio de um episcopado que lembra o de outros tempos.


Apresento-lhes os meus melhores cumprimentos.


Carlos esperança


À comunicação social:

COMUNICADO

Qualquer doente, recluso ou militar tem o direito de acesso aos ministros do culto da sua religião, um direito do qual ninguém deve ser privado. No entanto, a prestação de serviços religiosos não é da competência do Estado. Por isso, se por um lado a Associação Ateísta Portuguesa (AAP) reconhece a todos os crentes o direito à assistência espiritual, por outro repudia o recurso ao erário para financiar este serviço. A remuneração dos sacerdotes que visitem doentes, reclusos ou elementos das forças de segurança deve ficar a cargo das organizações religiosas e dos seus fiéis. A liberdade religiosa deve reconhecer a todos tanto o direito à sua religião como o direito de não pagar dos seus impostos a religião dos outros.

O acordo da passada segunda-feira entre o Estado e a Igreja Católica, ao contemplar a contratação de sacerdotes como prestadores de serviços ao Estado, é contrário ao espírito da liberdade religiosa. Não apenas por usar o erário que é de todos, crentes e não crentes, para pagar a alguns representantes de algumas religiões, mas também por obrigar o Estado a contratar cidadãos discriminando-os pela sua religião, discriminação esta que a própria Constituição proíbe.

E é uma medida desnecessária. Para respeitar a liberdade religiosa de reclusos, pacientes internados ou militares basta que o Estado permita visitas regulares por parte de qualquer sacerdote religioso a pedido dos interessados. Desta forma ninguém fica privado de acesso aos ministros do seu culto religioso, sem o constrangimento de ter de recusar serviços que não solicitou, em situação particularmente debilitada, no caso de reclusos e doentes.

Porque a remuneração pública de sacerdotes não é um requisito da liberdade religiosa, e porque é contrário a esta liberdade obrigar cada contribuinte a financiar religiões nas quais não crê e obrigar o Estado a contratar serviços discriminando os candidatos de acordo com a sua religião, a AAP (opõe-se a) repudia qualquer acordo que comprometa o dinheiro dos contribuintes (ao) para financiamento de práticas religiosas.

Separar a cidadania da fé é um dever cívico, tal como separar o Estado da religião é uma obrigação constitucional, esta, na opinião da AAP, grosseiramente violada na decisão do Conselho de Ministros.

Assim, a AAP denuncia mais este atropelo à laicidade e ao pluralismo e a escalada beata que confere à Igreja católica privilégios incompatíveis com um país democrático.

2009-07-19

A LIBERDADE DE UM ACABA...?

É costume ou, como agora se diz, recorrente, ouvir dizer que a liberdade de A acaba quando começa a liberdade de B. Confesso que nunca me debrucei, seriamente, sobre o assunto, até porque tenho um conceito de liberdade de A e B diferente do expresso pela frase-feita. Só que hoje, bem comido e melhor bebido, resolvi fazer uma análise ao assunto. Só que não sei o que vai sair daqui...
Ora, julgo entender que a frase refere o seguinte - por exemplo: eu tenho liberdade de fumar; mas essa liberdade de fumar acaba quando começa a liberdade de alguém não respirar o meu fumo. Ou, dito de outra forma, A tem a liberdade de fazer barulho, mas B tem a liberdade de não ser incomodado com o barulho de A. Portanto, para garantir a liberdade de B, o A priva-se da liberdade de fazer barulho.
Acho que é isto, mais ou menos.
Só que eu não concordo nem um bocadinho. E apetece-me colocar a situação ao contrário: a liberdade que B tem de usufruir o silêncio, acaba quando A toma a liberdade de fazer barulho. Concordam? Ou, aproveitando o primeiro exemplo: a liberdade de B respirar ar não poluído acaba quando começa a liberdade (inquestionável) de A fumar. Pode ser?
Meus caros, as liberdades não começam nem acabam: complementam-se. Só que essa complementaridade manifesta-se na educação e, principalmente, no respeito pelos outros. Porque berrar que "a tua liberdade acaba quando começa a minha" é um exercício de egoísmo bacoco e de filosofia de retrete.
Mensurar a nossa actividade social pelos hipotéticos limites à liberdade, é uma manifestação de falta de civismo.
Só.

2009-07-18

NOMENCLATURA

Ficámos a saber que o Estado Português mudou de nome: passou a chamar-se "Mota-Engil".
Se não acreditam. leiam aqui.
Ou será que passou a chamar-se "Dias Loureiro"?

2009-07-17

QUE MILAGRE(S) PODEREMOS ESPERAR?

Dizem, nos "mentideros" que o Papa caiu e fracturou um pulso.
É preciso analisar friamente a situação:
  1. O Papa é o representante de Deus na Terra.
  2. Para isso, foi eleito pelos que eram seus pares, devidamente inspirados pelo Espírito Santo - seja lá isso o que for.
  3. O Espírito Santo é Deus uno e trino e mainunseiquê.
  4. Era suposto o Papa estar protegido, pela Santíssima Trindade, de todos os males do mundo.
  5. Isto porque, em teoria, Deus tem mais que fazer do que estar a promover eleições atrás de eleições. Deus não é a Comissão Nacional de Eleições, para que conste.
  6. Verifica-se que, apesar de todos os pressupostos enumerados acima, o Papa não está protegido.
  7. O que me parece injusto - mas eu sou suspeito - já que não hesitou nem um bocadinho em curar o olho esquerdo de D. Guilhermina de Jesus.
  8. Mas não evitou que o seu empregado predilecto caísse e fracturasse um pulso.
  9. Mais grave ainda: o Papa foi transportado ao hospital. Deus cura o olho, mas não cura o pulso.
  10. Como se não bastasse, o pulso fracturado foi o direito, ou seja: o das benzeduras.
  11. O que me leva a perguntar: se o Papa não está protegido, quem o estará?

2009-07-09

"NÃO SEI O QUE ESTE PAPA ANDA POR AÍ A FUMAR..."

Indecentemente copiado do Diário Ateísta, onde está escrito com a caneta implacável de Luís Grave Rodrigues, eis um soberbo naco de prosa:

Foi hoje noticiado que o Papa Bento XVI resolveu arengar aos incautos que o ouviam e recomendar aos participantes da Cimeira do G8 que decorre na cidade italiana de L’Aquila que «tomem decisões e orientações úteis para o verdadeiro progresso de todos os povos, em especial para os mais pobres».

Pelos vistos, aqui temos um líder religioso que vive como um nababo no meio da mais anacrónica opulência e que tem a autêntica lata de vir apelar aos interesses dos pobres.

Aqui temos um autêntico energúmeno, que resolve recomendar aos líderes mundiais «o verdadeiro progresso de todos os povos», quando é ele o primeiro a viver rodeado de ridículas celebrações mitológicas inventadas por pastores primitivos da Idade do Bronze e, do alto do inegável ascendente espiritual que infelizmente ainda tem sobre quase mil milhões de pessoas, recomenda que se discriminem os seres humanos em função das suas razões identitárias.

Como se não bastasse, ainda temos de assistir ao desplante místico deste alucinado tarado sexual vestido de trajes circenses a recomendar que se tomem «decisões e orientações úteis» quando é ele o primeiro a privilegiar os risíveis dogmas religiosos que professa sobre a própria vida humana.

Não sei o que este Papa anda por aí a fumar; mas deve estar estragado com certeza!



NÃO SERIA MELHOR...?

Depois de ler esta notícia, dá vontade de perguntar: não seria melhor aplicar a medida preventiva adequada e dar cabo do gajo? Era um BOM duplo serviço que se prestava à sociedade.
Mas, claro, isto sou eu a pensar...

2009-07-04

"NÃO SOU POLÍTICO PROFISSIONAL"

Caro Sr. Manuel Pinho:
Admito e concedo que o caro Manuel Pinho (deixe-me tratá-lo assim; sempre foram uns anos de convívio...) considere esta crónica anacrónica (e esta? crónica anacrónica! Só mesmo eu.); mas a verdade é que só hoje consegui suster as gargalhadas que me provocava a lembrança daquela cornúpeta cena na Assembleia da República. Desde já declaro que não consegui compreender a que ou a quem se referia a gestualmente simbólica armação córnea que o Manuel Pinho representou: se queria indicar a situação do seu adversário político, ou se queria exibir a própria situação. É que se considerarmos a segunda hipótese, ninguém tem nada com isso, e ninguém tem que se considerar ofendido. Pelo que restará sempre a eterna dúvida e, sendo assim, a sua despedida das lides governamentais foi algo precipitada. Porque, num estado de direito democrático há-de permanecer, indelével, o sacrossanto princípio do in dubio pro reo. Faz parte do princípio da legalidade.
Mas não é isso que me traz aqui.
Logo após a despedida, pela porta do fundo, convenhamos, o Manuel Pinho apressou-se a mostrar-se arrependido - o que só lhe fica bem, pois é meio caminho andado para a salvação - e alegou, em sua defesa, que não era "político profissional". Ou seja, borrou, ainda mais (se é possível) a pintura. Melhor fizera se se calara.
Desde 1974 que temos vindo a ser governados, precisamente, por políticos profissionais. E o resultado é a merda que está à vista. Para o Manuel Pinho, o não ser político profissional era uma vantagem e nunca deveria servir de desculpa. Porque, olhe bem para as sondagens e para os inquéritos de rua: os portugueses estão fartos de políticos profissionais. Os portugueses querem políticos amadores, mas profissionais nos respectivos ramos, a gerir o país. Querem, por exemplo, um profissional de saúde no respectivo ministério, pode ser médico ou enfermeiro; na Justiça quer-se um profissional do foro, pode ser juiz, advogado ou escrivão; nas obras públicas, quer-se um engenheiro, ou arquitecto, ou empreiteiro da área. Um trolha já servia, desde que soubesse dizer "jamé". E assim por diante. Para político profissional basta que tenhamos o primeiro-ministro. Que, por ironia, é (ao que parece) engenheiro. Para quê? O primeiro-ministro é chefe. E, em Portugal, para ser chefe não é preciso ter conhecimentos; basta mandar.

"A MINHA PÁTRIA É A LÍNGUA PORTUGUESA"? (II)

Estou convencido de quefalar ou não falar português correctamente - ou, pelo menos, tentar fazê-lo - deixou de ser uma questão de conhecimento ou ignorância, e passou a ser uma questão de moda. Ainda não há muito tempo, a moda era o efectivamente; depois, passou a implementar-se isto e aquilo; ocasionalmente, despoleta-se um acontecimento qualquer, sem a noção de que despoletar significa, precisamente, desactivar, tornar inerte. De vez em quando ainda se vai ouvindo - e lendo - que amanhã vamos ter um dia solarengo, quando deviam dizer - e escrever - um dia soalheiro. Qualquer dicionário nos diz que um dia nunca pode ser solarengo, porque solarengo refere-se a solar e, neste caso, solar não tem a ver com o sol, mas sim com casa senhorial. O dicionário não deixa dúvidas:
solarengo
adj.
adj.
1. Relativo ao solar (casa nobre).
s. m.
2. Ant. Senhor de solar.
3. Aquele que, como serviçal ou lavrador, vivia no solar ou fazenda de outrem.

Ultimamente, está em moda a "acusação de ter morto o seu vizinho". Por exemplo. Ainda há dias, num qualquer programa televisivo a entrevistadora agradecia à entrevistada o facto de "ter aceite" o convite. Ah: também há pessoas que são encarregues de cumprir esta ou aquela missão...Também neste caso não vou alinhar na teoria da ignorância porque, a sê-lo, é grave. Trata-se de moda, ponto final. Ou seja: alguém escreve um disparate, outro acha piada e copia simiescamente. É mais ou menos como andar com os éculos na cabeça ou as calças a meio da coxa. Não interessa se está bem ou fica mal; copia-se e pronto. O que é preciso é "imaginação".
Ora, e volto a invocar a antiga "escola primária", donde não saía aluno que não soubesse as regras básicas da gramática (acho que hoje só se ensina isso nos doutoramentos ou mestrados), há verbos que têm dois particípios passados. Mas como essa explicação deve ser dada por quem sabe, aqui vai um texto retirado do "Ciberdúvidas da Língua Portuguesa", cuja consulta frequente aconselho. Ei-la, com a devida vénia:

Alguns verbos do português, que são chamados abundantes por Celso Cunha e Lindley Cintra, na Nova Gramática do Português Contemporâneo, têm dois particípios passados. Estes verbos mantêm um particípio passado conservador, isto é, que se forma segundo a regra geral da formação dos particípios passados, e têm outro considerado inovador porque não obedece à regra geral: Conservador: Matar – matado Morrer – morrido Ganhar – ganhado Inovador: Matar – morto Morrer – morto Ganhar – ganho O uso dos particípios passados não se faz, porém, de forma aleatória: com os auxiliares ser e estar usa-se o particípio inovador: «Ele está morto.» «Ele foi morto.» «O dia está ganho.» Com o verbo ter usa-se a forma conservadora: «O João tinha matado a galinha.» «Este ano tem morrido muita gente.» «O João tem ganhado muito dinheiro com aquele proje(c)to.» Note-se que o verbo ganhar está a perder o duplo particípio, sendo cada vez menos utilizado o particípio conservador. Começa a aparecer com alguma frequ[ü]ência tem ganho. Há, aliás, quem considere que esta é já a forma recomendável e identifique ter ganhado como um regionalismo conservador. A observação do consulente tem, pois, toda a razão de ser. Façamos votos de que os nossos "media" comecem a honrar e a respeitar a nossa língua como ela merece e como nós, ouvintes, telespectadores ou leitores, merecemos.

Edite Prada :: 09/02/2004

Nos casos acima, a entrevistadora devia agradecer por a entrevistada ter aceitado o convite, uma vez que o convite foi aceite pela entrevistada. Também as pessoas são encarregadas de cumprir uma missão, e não encarregues. Voltemos ao "Ciberdúvidas":

O particípio passado aceite emprega-se com os verbos ser e estar: essa resolução foi aceite/está aceite por toda a gente. O particípio passado aceitado emprega-se com os verbos ter e haver: ele tinha/havia aceitado isso quase desde a puberdade.


Acho que está tudo dito...



A

O PONTO E A VÍRGULA

Sinceramente, ando alarmado. Aliás, acho que os portugueses não têm consciência do que se está a passar. Vou ver se consigo explicar:
Desde os meus tempos da então chamada "escola primária" que o ponto serve, em tudo o que diga respeito a números, para dividir os milhares, e atribuiu-se à vírgula a aliás nobre missão de dividir as décimas. Por exemplo, que nem era necessário, já que os meus leitores são pessoas inteligentes, se não fossem não liam este blogue: 1.234,56. Perfeito! E acho que continua a ser assim.
Por isso, muito alarmado fiquei quando, hoje de manhã, em plena RTP1, uma comentadora se referia a "três ponto quatro milhões de portugueses" o que, nas minhas contas, perfaz qualquer coisa como 3.400.000.000 ou seja, em língua de gente, três mil e quatrocentos milhões de portugueses. É muito português, caramba!!! E eu a pensar que éramos aproximadamente dez milhões... Olha a minha ignorância.
Aliás, essa senhora já me tem pregado alguns sustos; ainda não há muito tempo, falou numa inflação de "dois ponto cinco por cento", ou seja, dois mil e quinhentos por cento. Só mais tarde é que percebi que que era ignorância da senhora, talvez dislexia; porque ela estava a ler um jornal onde estava escrito "2,5%". Ou seja, onde estava vírgula leu ponto.
Mas acho que há tratamento para isso...